Aquele cara era o tal, era também o assunto do momento naquela cidade pacata. Cidadezinha simples, onde seu povo não tinha muitas opções de divertimento a não ser em bares ou biroscas. Não era cidade turística, o povo não estava acostumado com pessoas que ostentassem riquezas.
Havia chegado um Circo e com ele um sujeito muito elegante, usando joias, roupas e sapatos de marcas. O comentário geral era de que ele pudesse ser o dono do circo. Como o barzinho do senhor Severino era o mais perto, ele passou a frequentá-lo.
Havia chegado um Circo e com ele um sujeito muito elegante, usando joias, roupas e sapatos de marcas. O comentário geral era de que ele pudesse ser o dono do circo. Como o barzinho do senhor Severino era o mais perto, ele passou a frequentá-lo.
- Seu Severino o senhor já comprou o “uísque” de marca que o moço do circo pediu? - Perguntou Josenildo, ajudante do Seu Severino.
- Já comprei, sim, por sinal, me deu um trabalheira danada pra encontrá-lo. Tive de ir à outra cidade procurar, mas só achei o nacional.
- Ihhh, seu Severino, o homem é chique pra "daná", não vai gostar disso.
- Que nada, Homem, deixa comigo... Cadê aquela garrafa velha com rótulo rasgado que o falecido Rufino esqueceu aqui?
- Seu Severino o senhor é demais... Dizem que quanto mais velho, melhor é o "uisqui"... Se o rótulo está rasgado e a garrafa é velha, ele vai pensar que a bebida também é velha. Nem vai notar que é nacional. Vixi, Nossa Senhora. O homem está vindo aí, temos que encher a garrafa.
- Boa tarde, Doutor! Seu Severino comprou seu “uísque” e está lá dentro passando pra outra garraf... Não, ele está lá dentro pegando a garrafa para lhe servir.
- Por favor, vou tomar só uma dose e depois vou almoçar. Qual é o cardápio de hoje?
- Olha, moço, aqui não temos isso, não. É PF mesmo... Tem ensopado de carne com batatas ou frango com quiabo.
- O senhor não tem um peixe, do tipo, salmão com alcaparras?
- Eu nem sei o que é isso, não, meu bom senhor... Mas pode deixar que vou anotar e o, seu Severino, irá providenciar.
- Está bem, me sirva qualquer coisa, pode ser ensopado mesmo. Ah, por favor, avise ao dono que hoje não deu pra ir ao Banco. Então amanhã eu pago essa a conta, ok?
- Não esquenta não, Doutor! Ele não vai ficar chateado, não.
O homem aproveitou-se de toda aquela delicadeza e tomou umas dez cervejas, além de toda a garrafa de Whisky e ainda conseguiu almoçar. Saiu bêbado que nem peru de natal.
No dia seguinte Josenildo perguntou de novo:
- Seu Severino o senhor já comprou o peixe com "alcatar"? Aquele negócio que o homem pediu, esqueci o nome.
- Seu burro!!! É salmão com alcaparras. Escuta aqui, vê se não promete mais nada para ninguém. Esse cara só pede coisas difíceis e coisas muito caras. E até agora não pagou conta nenhuma. Você não sabe o trabalho que tive e a distância que andei, e o pior, não encontrei. Então comprei cação mesmo e três pés de alface.
- Foi isso mesmo que ele pediu, Seu Severino?
- Claro que não, sua Anta! Mas não tem problema, na hora a gente o enrola, dono de circo tem muito dinheiro. O cara só sai daqui bêbado, vai pagar o preço do salmão, mas vai comer cação.
- Fala baixo, seu Severino, ele já está vindo.
- Caramba, já!? Nem aprontei o peixe. Na certa ele vai tomar primeiro umas e outras.
- Boa tarde!
- Boa tarde, moço! Seu Severino já está aprontando seu cação com alface...
- Não, não... Eu pedi pra vocês comprarem, salmão com alcaparras...
- Desculpa, moço, falei errado. Só que o peixe ele achou, mas o segundo negócio ai, alcapar..., ele não achou, não.
- Quer dizer que vou comer salmão com alface? Não tem problema, então, me trás uma dose daquele Whisky.
- Mas, mas... O senhor tomou o "uísqui" todo, ontem... Serve uma cachacinha?
- CACHACINHA!!!
Você está louco? Por um acaso eu sou homem de tomar cachaça? Por que vocês não compraram o meu whisky? Me trás uma cerveja mesmo, de qualquer forma deixa a cachaça aqui também.
- É pra já, Doutor.
- Ah, já ia me esquecendo, avise ao dono que ainda não tive tempo de ir ao Banco, ok?
- Já lhe falei, meu amigo, pessoas bacanas que nem o senhor, o seu Severino, nem esquenta.
- Vê se compra o meu Whisky, hein! Outra coisa, já que podemos escolher, amanhã eu quero comer caviar.
- Nossa!!! Essa comida eu já até ouvi falar, mas nunca vi, não Senhor...
- MEU AMIGO, estou morrendo de fome, vá pegar logo a minha comida.
- Desculpa, Doutor, vou pegar seu prato. - Falou o empregado adentrando à cozinha.
- Seu Severino o almoço daquele senhor já está pronto?
- Xiii!!! Ainda, não... Diz pra ele que estou ornamentando o prato... Sei lá... Dá teu jeito, inventa qualquer coisa.
- Caramba, seu Severino, o sujeito hoje está brabo. O quê vou dizer à ele?
- Se vira, Energúmeno.
- Valeu, seu Severino, deixa comigo, vou falar com ele.
- Moço, seu Severino, falou que seu "calção" está quase pronto.
- Calção??? Eu vou comer meu calção?
- Ué, não estou entendendo mais nada. O que o senhor pediu, então? - Perguntou o empregado super nervoso.
- Não pedi, calção nem cação, eu pedi, SALMÃO... Entendeu agora? E o caviar eu quero para amanhã. O senhor também esqueceu de trazer minha cerveja. Preciso ter uma conversa séria com o dono dessa birosca. Não é possível!
- Desculpe, moço, eu me confundo com essas coisas. Pode deixar que o seu caviar, o seu Severino irá providenciar... Vou pegar sua cerveja.
Mais tarde o empregado falou ao patrão:
- Seu Severino esqueci de lhe falar... O moço do circo disse que ainda não teve tempo de ir ao banco e amanhã quer comer caviar.
- O QUÊ? O que eu te falei? Pra não ficar fazendo promessas quase impossíveis. Ele tem que comer o que tem na casa. Onde vou encontrar isso? Vou ter que sair hoje e só voltar amanhã, porque pra encontrar isso, só no Mercado lá do outro lado do Rio. Vamos fechar a loja.
- Obá!!! Vamos sair mais cedo!? Acho que vou ao circo.
- Vamos, sim, vamos sair mais cedo, só que depois desconto do seu salário.
No dia seguinte a esposa doente do senhor Severino, ajudava na cozinha, porque ele ainda não havia chegado da sua peregrinação comercial. Então, aparece o sujeito.
- Boa tarde, moço! O seu Severino saiu à procura do seu pedido e até agora não voltou... O senhor quer esperar, ou quer comer macarrão, arroz, feijão e...e salada de alface?
- O que? Como vou esperar? O senhor já viu a hora? Faz favor, traga-me uma dose de Whisky... A propósito, qual é a carne que acompanha essa gororoba ai? Carne de frango, peixe ou carne bovina?
- Só o alface... Seu Severino esqueceu de descongelar tudo. "Uísque" também não tem, não senhor. Não sei se ele vai comprar, porque esqueci de lembrá-lo.
- É mesmo? Você é muito ENROLADO... Não volto mais aqui nessa espelunca. A partir de hoje, só vou frequentar o concorrente. Adeus!!!
- Mas, mas, mas... Vixi... Ele se foi.
- O que houve, por que aquele moço saiu daqui tão zangado? Na certa você aprontou alguma com ele. - Perguntou a esposa do seu Severino.
- Eu não, a culpa é do, seu Severino, que não chegou até agora. Será que barco afundou?
Nisso entra, o senhor Severino, esbaforido, molhado, mas feliz.
- O que houve, seu Severino, porque está todo molhado? Já sei... Não achou o caviar, né!?
- ACHEI... ACHEI O CAVIAR!!! Vou direto pra cozinha prepará-lo... Houve um probleminha com o barco, mas não importa. O que importa é que salvei o caviar... E esse cara vai pagar caro por isso. Dessa vez vou cobrar o triplo do valor.
- Seu Severin...
- Agora não posso, vou pra cozinha.
- Seu Severino, preciso lhe falar uma coisa. Acho que agora não precisa ter pressa, não.
- Ué, por que, ele vai chegar mais tarde?
- Não, não... Ele não vai chegar. Foi para o concorrente.
- O quê!? Mas ele pediu o caviar. Se não vendermos para ele não venderemos pra mais ninguém nessa cidade.
- É, mas o senhor demorou... Também não tinha "uísque", então ele resolveu ir embora dizendo que iria para o concorrente... A culpa foi sua, o senhor é quem faz as compras... Além disso, esqueceu de descongelar as carnes.
- Uhrmmm... Vou te esganar, seu desgraçado! Você não me lembrou de comprar o Whisky? E o que te falei? Pra que não prometesse mais nada para o homem... Esse mês tu vais ficar sem salário. Pelo menos ele pagou a conta, não é?
- Não... Tamb...Também esqueci de cobrar.
- SOME DAQUI... Vai lá no circo atrás desse cara. Só volta aqui com o dinheiro da conta.
- Mas, mas...
- Que mas, mas... VAI LOGO!
- Tô indo, seu Severino!
Passado alguns dias, o senhor Severino, recebeu uma carta do ajudante, Josenildo. E a carta dizia, assim:
Senhor Severino como o senhor me disse pra só voltar ai com o dinheiro da conta do moço... Eu ainda não consegui recuperá-lo, por isso, não voltei. Então, preferi escrever essa carta. Descobri que o sujeito não é o dono do circo, e sim, um mero "PALHAÇO". Ele até me deu em troca da dívida um relógio de ouro, mas como o senhor me disse pra levar só o dinheiro da conta eu vendi o relógio para o ourives da cidade. Depois ele desfez o negócio e falou que o relógio era falso... Só que eu disse à ele que o relógio era seu... Então ele falou que vai chamar a polícia. CUIDADO!!! Descobri também, que tudo o que o palhaço tinha era falso. Ele agora está comendo no concorrente mesmo e está pagando em dinheiro. O mais gozado é que ele não faz exigência alguma e come o que tem na casa. A propósito, estou trabalhando aqui no concorrente... Um forte abraço, seu Severino.
http://www.recantodasletras.com.br/contos/4624444
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