Aristeu tinha acabado de receber a pior notícia de sua vida. O médico havia pedido para que alguém da sua família comparecesse ao consultório. Teimoso, do jeito que era, forçou o doutor a lhe dizer o motivo do seu pedido. O médico disse, mais falou também, que ele tinha que levar a sério o seu tratamento.
- Eu lhe pedi que trouxesse um familiar, porque às vezes com o tratamento o paciente não se sente bem, pode sentir ânsia de vômito e a família precisa saber de suas limitações.
Saiu do consultório arrasado, afinal, estava com câncer e a previsão de vida era de seis meses. "Foi o que ele entendeu".
Entrou no carro e chorou. Chorou muito e ficou ali bastante tempo pensando como seria dali pra frente.
Chegando em sua casa, passou pela esposa de cabeça baixa e foi direto para seu quarto, afinal, ele não queria que ninguém soubesse. Sua mulher estranhou, porque ele nunca havia feito aquilo, sempre a beijava ao chegar. Curiosa, foi ao quarto lhe interrogar:
- O que houve meu amor, você passou e não me deu um beijo?
- Nada, mulher, deixe-me em paz.
Muito chateada, ela fez o que o marido a pediu, e saiu.
Passado alguns dias, Aristeu encontrava-se mais conformado, havia conversado com Dudu, seu amigo, sobre sua doença. Dudu que ficou sendo o único a saber, deu-lhe alguns conselhos, no sentido de aproveitar melhor o restante de sua vida, e que de resto, entregasse nas mãos de Deus.
- É, meu amigo, você tem razão. Vou fazer coisas que sempre tive vontade de fazer e nunca tive coragem, mas também tenho de pensar num jeito de deixar alguma coisa pra minha família. Quando eu morrer eles vão passar por muitas dificuldades.
De cara, Aristeu, fez um seguro de vida. Depois foi ao banco e fez um empréstimo muito grande, o máximo que pôde. Foi até sua casa, pegou a esposa e o cartão de crédito e a levou para uma loja de eletrodomésticos. Disse a ela que comprasse tudo o que estivesse precisando em casa. A esposa quase desmaiou de tanta felicidade...
- Mas o que houve, meu amor, ganhou na loteria? Você que é um cara bastante controlado, gastando desse jeito? Você estava tão pra baixo, tão desanimado e de repente me dá todos esses presentes. É de se estranhar! – disse ela com os olhos brilhando.
- Foi quase isso, eu recebi um dinheiro inesperado no trabalho e por coincidência ganhei também no bicho.
Defunto não tem divida mesmo, pensava ele.
O problema é que, Aristeu, também queria curtir o que ainda lhe restava de vida e começou a chegar tarde e a fazer muitas besteiras.
- Dudu vamos tomar uma cerveja naquele "inferninho" que tem lá no centro da cidade? Hoje estou a fim de pegar umas “minas” diferentes.
- Mas, Aristeu, você tem feito muito esforço e um monte de estripulias. Estou preocupado com sua saúde. Você esta bem, não tem que continuar com o tratamento? E os remédios, tem tomado?
- Se vou morrer mesmo, pra que fazer tratamento e tomar remédios? O médico disse que vou passar mal com o tratamento. Aí é que não vou poder beber mesmo. Além do mais, estou me sentindo um menino.
- Bem, já que é assim, vamos pra “night”! - falou Dudu.
Lá no local, após Aristeu sair do quarto com duas mulheres, Dudu muito preocupado o perguntou se ele havia usado camisinha.
- Pra que, eu vou morrer mesmo? E deu uma sonora gargalhada...
- Acontece que você não pensou em sua esposa, não é, seu estúpido?
Aristeu rapidamente mudou de assunto:
- Quando sair daqui vou tentar arrumar um dinheiro. Quer ir comigo, Dudu?
- Ué, você arrumou trabalho a noite?
- Claro que não, seu besta! Apesar de que....o que vou fazer não deixa de ser um trabalhinho.
- Aristeu não vai fazer nenhuma besteira, hein! A propósito... Que volume é esse em sua cintura?
- Deixa isso pra lá, amigo.
Dudu ficou muito desconfiado de que Aristeu fosse fazer alguma coisa de errado e resolveu não acompanhá-lo
Aristeu havia conhecido o dono de um ferro velho, que lhe prometera um bom dinheiro em cada carro roubado que ele o levasse.
- Vou fazer meu pezinho de meia e deixar minha família bem de vida. Depois eu posso morrer tranqüilo. Pensava ele.
Só que ele não tinha muito jeito pra essas coisas e muitas das vezes se atrapalhava todo. Uma vez o alarme de um veículo disparou e ele teve que correr muito, porque o dono estava perto e começou a gritar:
- Pega ladrão, pega ladrão...
Da outra vez ele tentou roubar um carro automático e não conseguiu sair do lugar, porque não sabia fazê-lo funcionar.
- Quem foi o doido que inventou esse tipo de carro?
O pior foi o dia em que levou um tiro de raspão na orelha, quase morreu, porque se pega na cabeça ele morreria antes do seu "prazo de validade" e não concretizaria seus sonhos.
Passado essas aventuras maquiavélicas, as dores de Aristeu pioraram e ele teve de voltar ao médico. De cara levou uma bronca sem tamanho por ter dito que não queria continuar com o tratamento e que também não havia tomado os remédios prescritos. Então o médico o intimou a fazer uma nova bateria de exames. Após ficar horas fazendo tratamento e uma infinidade de exames, o médico, o chamou em seu consultório.
- Sr. Aristeu, sente-se, por favor. Quem lhe falou que o seu tumor era maligno?
- Foi o senhor, doutor. Até me disse que eu só teria seis meses de vida.
- Eu não lhe falei que seu tumor era maligno. Eu disse que era benigno, mas que merecia alguns cuidados e teria de fazer um sério tratamento.
- Como é que o tumor era benigno se eu só teria seis meses de vida?
- Sr. Aristeu, o senhor não entendeu. Seis meses seriam de tratamento. Agora no mínimo o senhor vai precisar de mais seis meses. Sua situação piorou por falta de tratamento.
- O quê!? O senhor não me explicou direito. Gastei dinheiro com seguro de vida, estou devendo ao banco e ao cartão de crédito. Também estou devendo a justiça, porque, virei ladrão! Quase morri com tiro na orelha e posso estar aidético, passei doença venérea para a Patroa e a essa altura a polícia também deve estar atrás de mim. E agora o senhor me diz que não vou morrer!? E ainda tenho mais seis meses de tratamento.
O médico, sem entender nada, disse-lhe: - ihhh, acho que a doença afetou sua cabeça, irei lhe encaminhar à um Psiquiatra.
Aí, não prestou, o coitado, levou tantos catiripapos que não morreu por pouco, foi parar no hospital todo quebrado e Aristeu foi parar na cadeia. Sua esposa ficou sabendo de sua doença e comunicou ao sistema penal. E Aristeu teve de ser um paciente exemplar no hospital penitenciário.
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