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domingo, 24 de novembro de 2013

DONA ELIETE E OS ANIMAIS


- Gosto mais de animal do que de gente! - Assim dizia Dona Eliete, muito enojada da vida e do Ser Humano.

Era uma senhora com a idade bastante avançada que havia passado por determinadas situações e decidido deixar os prazeres da vida para se dedicar com afinco aos animais, inclusive largado ao corpo docente onde ficara anos a lecionar. Aceitava todo e qualquer tipo de animal, mesmo estando saudável ou doente. Podiam estar machucados ou atropelados e mesmo estando entre a vida e a morte ela chamava os amigos veterinários que muito a ajudavam. Ela os chamavam de Almas Caridosas!
Seu amor e carinho pelos animais era tamanho, assim como, a revolta que tinha com pessoas sem escrúpulos e que maltratavam os peludos. Por isso todos que iam em sua casa escutavam aquela frase acima.
Antes de aceitar um animal saudável ela fazia um tremendo "questionário", um monte de perguntas para seus donos do tipo: - Por que motivo os faziam querer desfazer-se dos bichinhos?
E muitas das vezes a vi dando bronca em quem simplesmente “queria se desfazer do animal” sem nenhuma justificativa.
- Vocês adquirem animais só por vaidades, não é? Isso aqui que você está me trazendo, não é brinquedinho, não, que quando fica velho ou quebrado pode ser jogado fora. O animal também tem sentimentos onde seu amor maior será sempre pelo dono. Pode ser rico ou pobre que ele estará sempre ao seu lado e mesmo que passe fome ele não te abandonará. Coisa que você não está fazendo nesse momento.
Ela tinha um estremo mau humor em relação as pessoas. Acho que para ela todos desconhecidos eram iguais. Mas com os bichos, não, era bem diferente. Eles o tiravam tudo que fosse possível, inclusive sua vida social, uma vida normal de um simples ser humano. Seu salário de aposentada era pequeno, muita das vezes, todos passavam por necessidades, onde a maior prejudicada era ela mesma. Deixava até de comprar coisas de uso pessoal, assim como: roupas, sapatos, bolsas, etc. Quase não ia a médico e nem se tratava porque os animais estavam sempre em primeiro lugar.
Haviam algumas empresas ou pessoas que a ajudavam, com: jornais velhos; restos de comida; remédios e às vezes dinheiro. Como na época ainda não existia ou era muito caro comprar ração, eu mesmo, a mando de minha mãe levava todo final de semana cabeça, pescoço e pé de galinha que o dono do aviário lá de perto da minha casa guardava aos dias úteis. Mesmo assim, às vezes não era o suficiente, tamanha quantidade de animais.
Dona Eliete andava com roupas rasgadas, não usava mais perfume, muito menos ia ao salão. Muitas das vezes eu via piolho descendo em sua testa ou até mesmo carrapato em seu vestido. E também já estava aparecendo feridas em sua pele. Parecia estar se igualando a eles, em sua: simplicidade; aparência; no olhar e na pureza de um animal. Assim como os animais, quando aparecia um estranho, ela se retraia e ficava muito desconfiada. Mas se a pessoa trouxesse algum tipo de ajuda, ou mesmo, uma palavra de amizade e carinho, Dona Eliete, fazia aquela festa e seus olhos se enchiam de lágrimas.
Muitos domingos a vi na feira, “na hora da xepa” catando restos de comidas e pedindo ajuda aos feirantes. Pessoas que não a conheciam a chamavam de Louca ou Mendiga sem saber a imensidão daquele coração; daquela dedicação; daquele amor e o quanto foi importante seu trabalho em relação aos animais. Aquela mulher foi única, nunca vi e nem conheci ninguém igual...
Depois casei e fui morar num bairro distante e perdi o contato. Mais tarde, fiquei sabendo que construíram um prédio ao lado de sua casa e que os moradores reclamavam muito do barulho e do cheiro dos animais. Entraram na justiça contra ela pedindo o afastamento dos animais daquele local. Também soube que ela morrera, não fiquei sabendo o motivo. Deve ter sido de desgosto porque além de ter abdicado sua vida como um ser humano normal e ter vivido como um animal, ela era feliz pelo que fazia e por estar ao lado deles.
Algo de bom ficou em mim, aprendi que a maior riqueza não está a vista dos nossos olhos, não precisamos ostentar valores materiais e que nossa maior herança está dentro de nós.
Agora quando passo em frente a sua casa sinto uma nostalgia e uma tristeza muito grande pela sua ausência, pelo que aprendi e pelos animais que também ajudei a resgatar. Quantos aos animais não sei onde foram parar... No "prédio maldito" ninguém soube ou não quiseram me falar. Devem ter ido parar na SUIPA...


Obs: Esse caso se passou na Zona Norte do Rio de Janeiro, mais precisamente no Bairro do Engenho de Dentro onde Dona Eliete morava.






sexta-feira, 22 de novembro de 2013

O DIA DA COLONOSCOPIA



Havia chegado o dia, aquele que seria um longo e péssimo dia. Um dia que ficou marcado, porque quando fazemos algo que não nos agrada o tempo custa muito a passar, e foi o que aconteceu.
Bem, esse também foi o dia "D"... O dia "de" eu ter perdido a virgindade anal. Não para um pênis, muito menos para o dedo de um médico, mais sim, para uma "máquina". Máquina essa que nem sabe fazer um carinho ou muito menos um sussurro ao pé do ouvido.
Neste dia que custou a findar, acordei ou levantei cedo da cama, porque, de tão tenso não havia conseguido dormir direito durante a noite que passara. Noite longa, de muitos pesadelos e pensamentos em relação ao que estava prestes a acontecer.
Era leigo, e o médico não havia me explicado nada sobre o assunto. Ele havia dito que seria algo parecido com o exame de endoscopia, só que por trás. Também disse para que eu fosse em jejum. Fiquei muito nervoso e pensava que pudesse doer ou mesmo gostar. Se doesse, como iria trabalhar sentado em meu táxi no dia seguinte? E se eu gostasse? Existem tantos homens que adoram ser penetrados é porque deram pela primeira vez... e gostaram.
Será que vou virar gay?     Pensava eu.
Então, tomei um bom banho e com uma buchinha que havia comprado na feira, caprichei na lavagem das partes íntimas. Usei até condicionador de cabelos e pasta de dentes para que não passasse por nenhum constrangimento de ter algum, "mau hálito anal”. Até perfuminho passei, mas não sabia que ardia tanto... Coloquei minha melhor cueca ou pelo menos a que não tinha nenhum furo, uma calça desbotada e uma camisa de malha apertada com os dizeres, "Bad Boy", e fui à luta. Nessas horas temos de mostrar o quanto somos machos, mesmo sabendo que iriam me entubar pelo rabo. Entrei no carro de um amigo, também taxista, que iria levar-me para aquele lugar "malditoso". Para meu espanto o cara deu uma sonora gargalhada e perguntou-me:
- Tu vais fazer o exame pelo umbigo?
Na hora não entendi o motivo da brincadeira, mas depois ele explicou:
- Você está de Baby Look...
É porque às vezes, gosto de tomar umas cervejinhas e minha barriga está um pouquinho saliente A camisa apertada deixou o bocão do umbigo de fora.
Cheguei à clínica mais nervoso do que já estava, pois virei motivo de chacota e além de ser esculachado na viagem inteira, também sabia o que iria acontecer comigo no dia seguinte quando chegasse ao ponto de táxi onde trabalho. Até porque, conhecia o tamanho da língua desse meu "amigo". Uma atendente pediu-me que esperasse num quarto e mesmo dizendo que não mais precisava de companhia, o amigo, insistiu e entrou comigo. Esperei por muito tempo, com fome e sede, até chegar uma enfermeira e falar que iria começar os preparativos para o tal exame:
- Toma... Coloca esse roupão aqui e fica sem nada por baixo, depois o senhor vai beber o líquido dessas três garrafas. Tem que tomar tudo, hein! Daqui a pouco eu volto pra botar o soro.
- Soro, mas que soro? Ninguém me falou nada de soro.
Apesar de o líquido ser muito ruim, beber até que foi fácil, porque eu estava com muita sede, mas não sabia o que estava por vir.
Fui colocar o roupão e tive de sair com a bunda encostada na parede, porque a parte de trás era toda aberta e o meu "mui amigo" queria tirar fotos de todos os ângulos. O cara além de linguarudo era pior que paparazzo, gostava de tirar fotos de todos os eventos. Para ele aquilo era um evento, mas pra mim aquilo era um tormento. Tirou fotos minhas com o roupão, tirou fotos da enfermeira me esperando para colocar o soro. Só não tirou fotos quando eu sentava no vaso porque eu trancava a porta do banheiro. E quanto mais daquele liquido eu tomava, com mais dor de barriga ficava. E todas às vezes que eu ia ao banheiro, iam dois encostos, o amigo que estava doido pra pegar um "furo de reportagem" e o pedestal do soro agarrado em mim.  Depois fui saber por outra enfermeira que o exame só seria na parte da tarde, me mandaram chegar cedo justamente para eu fazer a preparação. Disse-me também que nem o anestesista havia chegado.
- Anestesista, mas que anestesista, minha senhora? Não me falaram nada sobre anestesista.
- Você vai dormir. - disse ela.
O tanto que fiquei aliviado por tudo que foi falado, referente ao medo de doer, de gostar e dos pesadelos, foi o quanto fiquei preocupado com aquela terrível notícia. Afinal, já havia escutado alguns casos de morte por anestesia.
O amigo se despediu dizendo que voltaria na parte da tarde pra me pegar. O que foi um grande alívio, afinal, não precisaria mais me arrastar pelas paredes. Só que ficou um vazio muito grande, os pensamentos não paravam e achei que fosse morrer após tomar a anestesia. Peguei o celular e comecei a mandar torpedos de despedida pra toda a família e a alguns amigos. Disse a todos que os amava, e o pior, disse a um amigo que era muito grato pela sua amizade e que não precisava mais pagar o que me devia. Ninguém entendeu nada... Só não consegui me despedir da sogra, porque quando fui digitar, o médico entrou esbaforido pelo quarto adentro. Até levei um susto, mas ele foi logo dizendo que não havia chegado a hora de fazer o exame e que ainda tinha outros pacientes na minha frente.  Depois perguntou-me quantas vezes eu havia ido ao banheiro.
- Doutor eu não contei, mas acho que já fui umas dez vezes.
- É pouco, vou chamar a enfermeira.
Não entendi o motivo de ter que chamar a enfermeira, achei que fosse pra trazer mais garrafas daquele purgante horroroso. Minutos depois escutei umas batidinhas na porta e logo entra uma enfermeira que eu ainda não conhecia. Uma mulher muito bonita e delicada, só que, com outro tipo de garrafa em suas mãos, parecia uma bisnaga. Tive um pressentimento que algo de ruim estava pra acontecer, mas ao mesmo tempo, estava enfeitiçado com tamanha beleza daquela enfermeira. Uma beldade!!!  Então, ela me falou:
-Vira o bumbum... O senhor vai ter que tomar uma lavagem.
- O quê? Que negócio é esse de lavagem? Não preciso de mais lavagem... Já lavei tudo muito bem, tanto aqui, quanto em casa. Até condicionador, pasta de dentes e perfume eu passei.
- Não é por fora, meu senhor. É por dentro...
- Nem pensar! Quem mandou você fazer isso? Eu quero falar com o médico.
- Quem mandou foi o próprio médico e agora ele está ocupado.
Fiquei arrasado e constrangido, além dela me chamar de senhor, me enfiou aquele troço gelado por trás, não dando nem tempo de correr para o banheiro, sujei a cama toda. Por sorte, meu amigo não estava, porque senão iria tirar mais fotos. Ali, sim, seria um excelente, "furo de reportagem". Fiquei até depressivo, quase vesti as roupas para ir embora, mas aguentei firme, concentrei-me, rezei e fiz até uma autoajuda em pensamentos. Foi o que me consolou de lembrar que Gays ou mesmo mulheres, às vezes ficam a vida inteira com homens ou maridos que tem seus pênis enormes. Não reclamam nunca, pelo contrário, gostam. Fiquei envergonhado, afinal, estava com medo de um simples tubo de uma máquina ou de um computador, sei lá... Ou até mesmo de uma simples bisnaga, que já havia me feito defecar a cama inteira.
De repente, entraram dois homens com uma maca e falaram:
- Vamos lá, chegou tua hora.
Do jeito que eu estava pra baixo, achei que já estivesse morto. Chegou minha hora de que, de ser enterrado? Pensava eu... Mas ainda tive forças pra reclamar.
- Pô, vocês não sabem bater na porta, não? E se eu ainda estivesse de bruços? E para que essa maca?
- Desculpe-me, senhor... Essa maca é para levá-lo à sala de cirurgia.
- Não preciso de maca... E por incrível que pareça, ainda estou vivo e andando, além do mais, eu não vou pra sala de cirurgia, até porque não vou fazer cirurgia alguma. Só vou fazer aquele exame, que enfia... ou melhor, aquele exame que parece uma endoscopia. 
- São normas do hospital, o senhor tem que ir de maca... E para sala de cirurgia, sim, porque acidentes acontecem e os seus intestinos podem ser perfurados.
- Aiii, meu Deus!!! Cadê o médico, cadê o meu amigo???
Fiquei mais perdido do que cego em tiroteio, mas tive de deitar na maca. Levou uma eternidade para que chegássemos à sala onde seria feito o exame. Até chegar lá, eu só conseguia ver as luzes do teto e a cara dos carrascos. Depois de passarmos por vários corredores e um elevador chegamos ao local. Por fim, o anestesista, me fez algumas perguntas e também me disse que iria aplicar uma injeção, assim,  logo apaguei, saí do ar... Dali para frente não vi mais nada e também não esperava que o exame fosse tão tranquilo. Não senti nada, não vi nada e ainda tirei um sono muito gostoso. Na realidade acho que aquilo nem era anestesia, e sim, um "Sossega Leão". Um relaxante muito forte que nos faz dormir. Ao término do exame, logo que acordei, o médico me disse que estava tudo bem e que o único problema que tiveram foi com os barulhos. Então, curioso como sou, perguntei-lhe:
- Mas que barulhos foram esses, doutor?
- Rapaz como ainda tinha gases ai dentro e como tu roncas, hein!!!
    



quinta-feira, 21 de novembro de 2013

MISÉRIA, POESIA E TRISTEZA



Um sujeito maltrapilho, sujo e sem a maioria dos dentes da frente ficava a pedir esmolas em frente à casa do seu Manoel. Sua esposa bastante chateada com aquilo vivia a reclamar:
- O Manoel você tem que tomar uma providência, esse cara fedorento em frente à nossa casa fica deixando restos de comida pelo chão, qualquer dia vai ficar cheio de ratos por aqui.
- Calma Mulher! Vou falar com ele.
Então seu Manoel saiu para conversar com homem. Chegando ao local encontrou-o lendo um velho livro de poesias, e disse:
- Moço o senhor pode sair de frente da minha casa? Está muito sujo e estamos sentindo esse cheiro lá dentro.
O homem respondeu:

- Meu caro, amigo,
estou ao relento
porque ninguém me dá abrigo,
ajuda e sustento.

- Por que o senhor não procura um albergue? Na minha porta é que não pode ficar...

- Estou aqui por uma causa nobre,
por isso não me esnobe,
só trago o amor,
meu bom, senhor.

- Que amor? Você está me atrapalhando!

- Atrapalhando!?
Eu só estou explanando
a minha situação
sem abstenção.

- Logo vi... O senhor não é dessa cidade.


- Eu vim lá do sertão,

do sertão do Maranhão,

lá não tinha nem calçado,

mas esse era o meu fado,

ficar de pé no chão.


Até o pão faltava,

meu filho então chorava,

tamanha necessidade

vivíamos de caridade.


Mas foi aí que meu pai me disse:

- Deixe de tolice

e vá a outra cidade procurar

um emprego e casa pra morar.


O senhor Manoel já estava ficando comovido com aquela situação, então, exclamou mais uma vez:
- O senhor não sabe que chegar a uma cidade grande sem ter ninguém da família para ajudá-lo fica muito difícil? E o que tem feito depois que chegou? Já conseguiu algum emprego e onde está seu filho?


- Cheguei à grande cidade

sem saber o que fazer,

mas a minha realidade

é não ter o que comer.


Durmo ao relento,

procuro meu sustento

pedindo esmola,

mas o que me consola

é o pensamento

de saber que meu filho

não é mais maltrapilho,

com uma rica família ele está...


- Ué, mas ele encontra-se aqui nessa cidade? Perguntou Sr. Manoel.


- Sim, e sei que está muito bem... Por isso não vou mais além,

me abrigarei na igreja,

porque não quero, que assim, ele me veja.

Sairei, sim, de frente da casa dele,

mas antes queria lhe agradecer o tanto que faz por ele...


&


Meu Deus!!!

O senhor é o genitor do meu filho?!

Entre, não haverá empecilho,

não irei desprezá-lo,

só quero abrigá-lo

e lhe dar um pouco de conforto,

porque nosso filho está morto.


Fiz o que pude,

ele não tinha saúde

e hoje encontra-se no céu...



terça-feira, 19 de novembro de 2013

CONFUSÃO NO ALTAR






Aristeu encontrava-se horas a fio enchendo o saco dos fregueses do bar de seu Manoel. Seu estado etílico não era dos melhores, foi quando, pediu ao dono pra beber mais uma cana. Com a negativa, ele alegou que seria a saideira e depois iria embora dormir. Tanto fez que conseguiu convencer o dono à servi-lo, mas de repente ouve-se um grito:

- AAAiiii, meu Deus! Seu Cretino, está bebendo de novo!? Esqueceu que vai me levar à um casamento?

- Vou levar, sim, mulher...  Mas antes vou terminar de beber esse copinho aqui, depois tiro um cochilo e a gente vai, ok?

- Cochilo!? Já estamos mais do que atrasados... Vamos embora, não vai beber mais nada. Cachorro, safado, sem vergonha!

- Isso mesmo, Dona Gertrudes, bota ele pra casa, já fez muita besteira por aqui. - Falou seu Manoel, o dono do bar.
Chegando em casa, Dona Gertrudes, disse:
- Toma banho rápido e escova bem esses dentes pra diminuir esse bafo de cana.
Terminaram de se arrumar e saíram, mas custaram a chegar, porque Aristeu arranhou o carro na saída da garagem, depois parou no caminho para tomar mais uma birita. Alegou para a mulher que estava apertado para ir ao banheiro. Depois no estacionamento teve muita dificuldade para estacionar. Empurrou o carro da frente, empurrou o carro de trás, mas enfim, conseguiram chegar a igreja. Sua esposa, preocupada pelo atraso abriu a porta do carro e saiu apressada.
- Espera mulher, vamos entrar juntos...
- Você está bêbado e só me faz passar vergonha.
Gertrudes entrou sozinha na igreja, avistou uma amiga e sentou ao seu lado, não deixando vaga para seu marido.
- Olá, amiga! Tudo bem, o que houve, parece assustada?
- Meu marido só me faz passar vergonha, está "num porre só". Não quero ficar ao lado dele.
Passado alguns minutos, escutaram um forte barulho, todos olharam para trás e o padre parou a missa. Vários homens levantaram para socorrer uma pessoa caída. Era ele, Aristeu manguaça da silva, caído ao chão. Havia tropeçado no degrau da escada e caiu por cima do pedestal de flores.
- Viu só, amiga? Eu pensando que ele já estava sentado. Deve ter ido beber mais... Bem, deixa ele pra lá, não quero nem saber.
O Padre voltou a falar por mais alguns minutos e teve de parar a cerimonia novamente. Chamou a atenção de algumas pessoas que estavam cochichando e dando risinhos. Gertrudes havia escutado um, "disse me disse", mas não sabia direito do que se tratava. Resolveu olhar para trás, foi quando, só confirmou pra amiga o quê lhe dissera. Que ele só lhe fazia passar vexame. Simplesmente todos riam, porque Aristeu estava dormindo e roncando muito alto. Ela levantou da cadeira e foi acordá-lo:
- Vou te matar, homem! Vê se não dorme mais, estão todos te olhando. Você ainda está usando esse rádio de pilha aqui dentro da igreja?!
- Não está vendo, mulher? Estou com fones de ouvido.
O padre voltou com a cerimonia com cara de poucos amigos, mas quando chegou o momento de reflexão, que os convidados vão tomar a hóstia, e depois, rezar... ouve-se um grito estridente:
- GOOOOLLL do MENGÃO!!!
O Padre deixou a hóstia cair tamanho susto que levara. Parou tudo novamente e falou que dá próxima vez iria pedir para Aristeu se retirar. O noivo por sua vez, "um tremendo vascaíno", bufava de raiva:
- Calma, Tenório, não faça nada, assim você estraga nosso casamento. - Falou a noiva.
Mas parece que ela estava adivinhando, porque, mais tarde, chegando ao término da cerimonia, o Padre fez aquela tradicional pergunta: 
- Se existe alguém contra esse casamento, que fale agora ou cale-se para sempre. Aristeu pediu a palavra... Levantou-se,  foi até o altar, meteu a mão no microfone e disse:
- Senhoras e Senhores... Não tenho nada contra esse casamento, apenas quero dar o meu testemunho como amigo da família. Vi e acompanhei a juventude problemática da Maria... Hoje é uma mulher séria e moderna... Anda de sainha curta e não tem papas na língua. Às vezes fala muito palavrão, mas quem não fala? Tem muitos amigos e também conhece muita gente boa...Todos os dias chega de carona em um carro diferente. E só carrão, hein! Cada carro mais bonito que o outro. Quanto ao Tenório... Bem, do Tenório sou suspeito pra falar... Mas vamos lá... Nos encontramos todos os dias pelos bares da vida. Rapaz distinto, só aparece com roupa de grife e carros importados. Não sei como consegue tanto dinheiro se não o vejo trabalhar... Mas, ajuda muito suas primas, sempre o vejo dando presentinhos para elas lá na casa da luz vermelha. E que primas, hein, Tenório!? O coitado diz que tem alergia a banheiro de bar. Tanto é que todas às vezes que entra, sai de lá com o nariz vermelho e cafungando muito. Fica mais alegre, brinca com todos e até paga cachaça para nós.
- Que negócio é esse de primas, Tenório? E que alergia é essa, nunca vi você dar um espirro se quer? - perguntou a noiva.
- E que história é essa de todos os dias você chegar de carona e cada dia com um carro diferente? 
Enfim, casamento encerrado, noivos solteiros, igreja quebrada, o Padre desmaiado ao chão e o Aristeu... bem, o coitado do Aristeu que ainda pretendia tomar um gole daquele "vinho santo", apanhou que nem boi ladrão... Apanhou tanto, mas tanto, que ao invés de ir para a festa que não houve por sua culpa, foi direto para o hospital delirando e achando que estava indo para o salão tomar champanhe de comemoração.


quarta-feira, 13 de novembro de 2013

O ENTERRO DO SEU MANOEL DA BIROSCA




O enterro do seu Manoel da Birosca iria ser na parte da tarde, mas o povo desde cedo encontrava-se em seu velório. Dona Maria Bigorna, sua esposa, era adepta de um bom prato e não ficava sem uma birita. Logo que seu marido faleceu ela encomendou bastantes bebidas e salgados, e malandramente, divulgou para seus fregueses. Os “amigos” e frequentadores da birosca do senhor Manoel, sabendo disso, lotaram o velório daquele bondoso senhor. Estavam muito empolgados, afinal, nunca tinham visto um enterro tão festivo e regado a comes e bebes. Porém estavam “preocupados” pela demora da, senhora Bigorna, então, seu Alair do Pé Inchado, comentou com seus amigos:

- Cadê dona Bigorna que não aparece, hein? Tô cheio de sede e ela está demorando muito...Onde será que ela se enfiou?

- Do jeito que ela bebe, esse velório vai ser uma festa. – Falou Biricutico empolgado.

- É, amigos eu já fui lá no bar tomar uma e fiquei duro, tive de pagar a vista. Que falta o seu Manoel faz, não é mesmo pessoal? Com ele a gente pendurava. – Disse seu José Du Calote.

Na realidade ninguém pagava nada ao seu Manoel, o enrolavam sempre. Dona Bigorna sabia e se estressava muito com eles por causa daquilo. Depois que a metade da clientela encontrava-se de porre e a outra ainda estava nos bares dos arredores, chegou Dona Maria Bigorna, chorosa, mas com os salgados e as bebidas que prometera... Estava acompanhada dos seus cinco filhos: Pedrão do Bope; Paulão Senta a Pua; Marcão Tijolada; Ricardão Capoeira e Serginho Mengão, da “torcida raça rubro negra”. De repente o velório lotou, parecia que tinham vindo pelo cheiro dos salgados e das bebidas... Conversa vai, conversa vem, João Deprê ao ver os filhos do seu Manoel, comentou com os amigos: 
- Eu estou com um mau pressentimento, não devia ter voltado lá do bar.
- Está maluco? Você iria perder esse tremendo velório? Relaxa e toma mais um copo, pelo menos aqui é de graça... E a nossa dívida com Seu Manoel também acabou, ele morreu... Vamos comemorar, minha gente! – disse Enfadonho Talagada.
- Fala baixo... Nós não estamos comemorando nada. Você já está bêbado? Viu o tamanho dos filhos dele? – falou Deprê.
- Vi, sim, e daí? Vai dizer que também não posso dizer que sou Vascaíno? Vascooo, Vascooo, Vascooo... – respondeu Talagada.
Todos rapidamente saíram de perto de Talagada, porque sabiam da fama dos filhos Flamenguistas do Seu Manoel.
Mais tarde, após estarem todos de barriga cheia e de ter rolado muita bagunça, inclusive, quase derrubaram o caixão, os filhos de Dona Maria Bigorna amontoaram-se na porta e não deixaram que mais ninguém saísse. Seu João Deprê ainda tentou escapar e disse que queria ir ao banheiro, mas Ricardão Capoeira não deixou... Alegou que a oração já iria começar e queria que todos ficassem, porque sua mãe faria uma homenagem a seu pai. Então, Anastácio Dupó Traçado da silva, perguntou ao Deprê:
- O que houve, você está com cara de preocupado?
- Ai, meu Deus do céu... Vai acontecer alguma coisa de ruim e eu estou apertado para ir ao banheiro. Eu devia tão pouco ao Seu Manoel... Só uns mil reais.
- Por que você está falando isso? A dívida agora acabou... Olha, parece que Dona Bigorna vai começar com a homenagem.
Dona Maria Bigorna, após pedir a palavra, pegou na bolsa um caderno com uma lista imensa de fiados e declamou:
- Tenho a certeza de que o meu Marido faleceu por causa disso aqui...
Seu José Du Calote jogou-se pela janela que era no quinto andar, caiu em cima do roseiral... Se furou e se quebrou todo, mas conseguiu escapar. Todos juntos começaram a rezar, uns até a chorar, mas ela firme continuou:
- Manoel se vivo fosse iria gostar de ver o que vai acontecer agora...
Seu Deprê teve um ataque de histeria, mas ela não ligou. 
- Nesse caderno consta o nome de pessoas que diziam ser nossos amigos e principalmente do Manoel...
Enfadonho Talagada, Biricuticu e mais umas dez pessoas tiveram um mal súbito. Anastácio Dupó que encontrava-se ao fundo, mesmo sendo procurado da justiça, preferiu pegar o celular e ligar para polícia. Falando baixinho, disse que iria se entregar, mas que viessem logo. 
E Dona Maria continuou:
- Pessoas que só vieram aqui, por interesse na bebida e na comida, onde, não vi uma lágrima se quer...
- Olha meus olhos, Dona Bigorna, vermelhos de tanto chorar. Por sinal, esse enterro sai ou não sai? – perguntou seu Ataláio Jurubêbo
- Seus olhos estão vermelhos por causa da cachaça, seu Ataláio. O Senhor está chorando agora, não sei porque motivo...
Nesse chove e não molha, nessa lengalenga, Dupó, olhou pela janela e gritou:
- A Polícia vem aí!!!
Os filhos de Dona Maria sumiram, foi um corre-corre generalizado, gente rolando pela escada, gente se escondendo atrás do caixão e o Anastácio Dupó indo em cana.
Mas tarde, após o enterro, um coveiro comentou com o outro:
- Eu nunca vi um enterro tão vazio, só tinha a viúva. Esse cara devia ser muito ruim.
- Eu não entendi, o velório estava cheio de gente, mas ninguém quis assistir ao enterro. A viúva  ficava o tempo todo falando ao Marido que fez as suas vontades... Deu  uma festa em seu velório, não brigaria mais com seus amigos e nem iria mais cobrá-los as dívidas. Ela também falou que não entendeu o motivo do tumulto, porque só queria dizer-lhes umas verdades. E que não sabe porque os filhos também sumiram. 

A FARMÁCIA/BOTECO DO SEU JOAQUIM




O boteco do Seu Joaquim era bem incrementado, tinha de tudo, desde farinha até melado. Mas o forte daquele barzinho era mesmo a "farmácia" de bebidas.

- Sr. Joaquim fiquei com uma diarreia que está um horror.
- Tome uma genebra, meu bom Senhor.
- Seu Joaquim, por favor, eu queria aquele remédio para resfriado.
- É comigo mesmo, vou fazer um coquetel e logo ficarás curado.
- Por favor, Seu Joaquim, eu queria aquele remedinho que tomei da outra vez para dor de cabeça.
- Amigo, não enlouqueça! Eu agora tenho um a base de ervas... O nome é "paratudo"... É só acrescentar uma cachacinha e não doerá mais sua cabecinha.
O Seu Joaquim tinha tudo que era "remédio": licor de menta para rouquidão; licor de mel para expectorar; jurubeba para o fígado; etc, etc, etc...
No outro dia apareceu um "Freguês-Cliente" desesperado:
- Boa noite! Seu Joaquim preciso lhe falar a sós.
- Pois não, Amigo, está com algum problema?
- Sim, eu pifei...
- Pifou??? Como, você desmaiou? Ah, eu tenho um reméd...
- NÃO! Não é nada disso seu Joaquim.... Eu pifei na cama com a minha amada.
- Por que, não disse logo, Homem? Tome uma catuaba.
Aquela situação estava ficando séria porque a "Pinguçada-cliente" acreditava mesmo nos "milagres" de seu Joaquim" e sua esposa também já estava ficando preocupada:
- Joaquim eu já falei para você parar com isso. Um dia terá problema, você não é médico...
- Que problema, Mulher?! Eu dou a eles, o que eles mais querem, que é a bebida.
- Desculpe-me atrapalhar o papo... Seu Joaquim estou enjoado e com uma ressaca sem fim. Eu estou pensando em tomar uma água tônica.
- Água tônica? Você está maluco!? Não fique assim, não sabe que pra curar ressaca tem que tomar outra para rebater? Vou abrir uma cervejinha para o Senhor.
Certo dia a “farmácia-boteco” do seu Joaquim não abriu e alguns fregueses, foram ao bar do concorrente e comentaram:
- O boteco do seu Joaquim não abriu hoje. O que será que aconteceu?
- Escutei falar que ele passou mal e foi ao médico.
- Logo hoje que minha pressão caiu... Eu queria que ele me indicasse um remedinho daqueles.
- Vocês não estão vendo que esse cara é um Charlatão? É por isso que vocês quase não vêm aqui, não é mesmo? Se ele passou mal, por que, não tomou dos seus próprios remédios? - Falou o concorrente, dono do outro bar.
- É mesmo, noutro dia ele me disse para tomar catuaba e que minha esposa iria ficar encantada. Me deu foi uma dor de barriga danada. - Disse um Freguês
- Ah, ele me paga. - Disse outro.
No dia seguinte bem cedo, antes de seu Joaquim abrir o bar, todos os fregueses já o esperavam ao lado de fora. Dona Carmelita, que era muito desconfiada, comentou:
- Sei não, Homem, olhei pelo basculante e os Fregueses já estão todos esperando o boteco abrir. Nunca aconteceu isso.
- Mulher! Esqueceu que não abrimos o boteco ontem? Estão todos sedentos.
Ao abrir, os Fregueses entraram vagarosamente e começaram a fazer-lhe perguntas, do tipo:
- Por que o Senhor não abriu ontem, seu Joaquim?
- Passei mal, Homem!
- E por que, o Senhor não abriu?
- Ué, já não falei? Passei mal.
- O que o Senhor teve?
- Ah, rapaz, fiquei desarranjado, enjoado e...
- Por que o senhor não tomou dos seus próprios remédios?
- Eu não bebo.
- O que?! Pra gente o Senhor diz que é remédio, mas para o Senhor é bebida. Vamos pegá-lo, pessoal.
Coitado do seu Joaquim, depois que a cobra fumou, o gato berrou e a casa caiu, ele ainda teve de provar do seu próprio remédio. Enfiaram-lhe pela goela adentro todos os tipos de “remédios” que ele os tinha.
Passado uma semana, o bar do concorrente encontrava-se cheio. O dono, curioso, perguntou para um freguês:
- Depois daquele dia que conversamos, o Senhor Joaquim não abriu mais o boteco, o que vocês aprontaram com ele?
- Esquenta não, moço... Ele deve estar até hoje de ressaca.
- Ressaca? Mas ele não bebe e ressaca não leva uma semana. 
Eu não sei o que ele tem, mas me falaram que ele está muito rebelde, não quer tomar remédio de jeito nenhum e está surtando. Dizem, que noutro dia, ele até vomitou quando a Dona Carmelita deu-lhe um remédio líquido, ele achou que era bebida. 





sexta-feira, 8 de novembro de 2013

UM TAXISTA SENSÍVEL




 Havia um taxista na cidade de “cacha pregos”, que era um doce de pessoa. As mulheres o amavam e adoravam andar em seu taxi. Seu nome era “Jacinto Leite Aquino Rêgo”.

- Gostei de andar em seu taxi, então, você pode sempre "me pegar, Aquino Rêgo”. Pode ser todos os dias, nesse mesmo horário. – disse uma passageira, em tom de brincadeira, que ele acabara de conquistar.
- Olha... Não gosto muito dessas brincadeiras, não. Mas te pego aqui em sua casa todos os dias, ok?
- Que brincadeira? Só porque, lhe chamei pelo Sobrenome e falei para você me pegar. Quando digo, "vem me pegar, Aquino Rêgo" é pra você vir me pegar com seu taxi...
Em compensação os homens o odiavam. Quando viam aquele carro cor de rosa com bigorrilho aceso, disfarçavam e não faziam sinal, muito menos o ligavam.
Apesar de, “Jacinto Leite Aquino Rêgo, deles” não ligar, gostava muito de fazer com eles o que seu próprio nome o propunha.
Mas quem lhe dava mesmo lucro era a mulherada.
- “Jacinto Leite, gostosinho”! – falava brincando uma passageira.
- Não fala isso, você sabe que não gosto. Minha praia é outra.
- Quanto tempo que não lhe “pego, Aquino Rêgo”. Estava com saudades. – dizia outra passageira, sorrindo.
- Para com isso, meu amor! Não gosto dessas brincadeiras.
As mulheres sabiam de sua preferência sexual, mas gostavam de tirar sarro com Jacinto. Até que um turista desavisado lhe fez sinal.
- Poxa... Quanto tempo não pego um Bofe. Vou parar.
- Boa noite! – disse o passageiro.
- Boa noite, amor! Jacinto “Seu” Leite Aquino Rêgo ao seu dispor.
- Como é? Não entendi!
- Eu falei meu nome, mas como gostei de você, botei o “seu” no meio.
- O que você botou no meu, Cara, e no meio de que?
- Eu não botei no seu, eu botei no meio do meu. Eu acrescentei o "seu" no meio do meu nome: Jacinto "Seu" Leite Aquino Rêgo.
- Mas você falou que botou no meu. Você disse: "Seu". - o sujeito não estava entendendo nada.
- Olha, meu amor, estou achando que você quer botar o "seu" no meu mesmo. Quero lhe dizer que aceito. Vou repetir o que lhe falei, Jacinto “Seu” Leite Aquino Rêgo ao seu dispor. Faça o que quiser de mim. Vem cá, meu gostosão... Me me dá um beijo, meu "gatão"...
- O que? Você está preso...
- Isso, meu amor! Me prende, me leva pra sua casa, me amarra em sua cama e me dá uns tapinhas. Adoro isso...
O turista desavisado nada mais era, do que o novo delegado daquela pequena cidade. Jacinto sumiu por uns dias, deixando suas passageiras na mão. Quando apareceu, estava com o nariz quebrado e olho roxo.
- O que foi isso, Jacintinho? Foi aquela brincadeira do tapinha que você tanto gosta de fazer com seus namorados? - perguntou uma passageira preocupada.
- Mulher... Nem te conto... Quando levei o primeiro safanão, até gostei. Pensei que ele também gostasse de levar uns tapinhas. Então, enchi a mão, e dei uma tapa no bumbum dele. Mas depois...





                            

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

AMÂNCIO ERA MANSO, MAS NEM TANTO.


Amâncio era um cara muito na dele, não tinha maldade nem inimizades. Era um cara muito bacana.
Certo dia, andando pela rua, um homem o esbarrou e sua pasta caiu e se abriu, voaram todos seus documentos. O mas incrível é que numa situação dessas ele ainda se desculpava achando que estava errado.
Os amigos o faziam de gato e sapato, aprontavam sempre com ele... Pediam dinheiro e não lhe pagavam, pegavam seu carro emprestado e custavam a devolver, quando não, o amassavam. Até com sua esposa o povo mexia. Amâncio, por ser muito bom, gostava de fazer favor para os outros sem ter retorno algum e quanto a sua esposa, ele falava aos amigos:
- Eu não fico chateado quando a elogiam e dizem que ela é bonita ou gostosa. Pior seria se dissessem que ela é feia.
Só que havia um boato maldoso, onde falavam que Amâncio apanhava da esposa. Era um cara muito forte, corpo atlético, mas de vez em quando aparecia com algumas lesões. Ele alegava ser do futebol, mas o pessoal não queria saber e o chateavam muito, dizendo:
- O Amâncio apanha da mulher... Quem apanha de mulher é mariquinha!
E claro, ele não gostava de escutar aquilo, mas tinha muita classe e fingia não ouvir. Era muito forte, mas também tinha muito auto controle e não ligava para as provocações.
Amâncio amava muito sua esposa e também era muito atencioso em casa. Tudo que ela o pedia ele prontamente atendia. Era o marido ideal 
e amigo também. Pena, que, por ser muito legal muitos abusavam de sua boa vontade.
- Estou me cansando dessa vida de ser bonzinho, todos me passam para trás. – desabafou Amâncio à um amigo.
- Meu camarada! Você tem de parar de ser fornecedor e vir a ser consumidor. – disse o amigo.
- Não entendi, como assim?
- Eu quero dizer que você fornece tudo, seus amigos te pedem tudo e te passam para trás. Até sua mulher você está fornecendo, Amâncio.
- O quê? Que história é essa da minha esposa? Você está maluco? – disse ele muito aborrecido.
- Meu amigo, se liga...vai consumir outras mulheres também. – falou Clarisbadeu.
Amâncio foi pra casa desapontado, ele nunca pensara que pudesse acontecer aquilo. Não tirava aquelas palavras da cabeça.
Passou a observar melhor sua esposa e a percorrer todos seus passos. Até que descobriu a verdade.
Estava sendo traído, e com um de seus amigos. Era o Ricardão... Aquele que mais o gozava dizendo que Amâncio apanhava da esposa.
- É por isso que ele sabe de tudo. Ela é quem comenta com ele que me bate. E o pior é que o safado fica espalhando pra todo mundo.
Amâncio manteve a calma costumeira, esperou a hora certa. Foi quando encontrou aquela roda de amigos no clube que frequentava, e o traidor estava no meio. Como de costume veio difamá-lo:
- Está chegando o Maricão que apanha da mulher. – e todos riam.
Amâncio engoliu a seco...e falou com toda calma que lhe éra peculiar:
- Eu preciso confessar uma coisa pra vocês. Ela às vezes me dá uns catiripapos, sim.
Aí, teve gente até caindo ao chão de tanto rir, e o traíra só dizia:
- Não falei...não falei...
Amâncio foi chegando mais perto do falastrão, falando cada vez mais baixo e disse:
- Eu não só apanho da minha esposa, como fui muito judiado e traído.
As pessoas riam cada vez mais e o humilhavam com palavras:
- Ricardão, cuidado que ele vai te beijar, hein!
- Eu ainda não terminei. Como eu estava dizendo...ela me trai com um de vocês e ainda me bate muito. Mas se eu tivesse feito com ela o que vou fazer com vocês, ela não estaria mais nesse mundo.
Ficou um silêncio sepulcral, todos olhando entre si. Foi quando Ricardão falou:
- Sujou! Aiiii...Socorro!
Ricardão levou uma surra tão grande, que está internado no hospital, por sinal, seus amigos ainda não foram lhe visitar porque estão todos sumidos. Desapareceram!

ASTOLFO PULOU A CERCA

Todos estavam à procura de Astolfo, olharam em todos os lugares, dentro e fora da casa e não o encontraram. Marieta, a empregada, que Gertrudes acabara de contratar, disse:

- Eu vi o cachorro olhando muito pra casa do vizinho ao lado.
- Qual, do seu Inocêncio?
- Não sei, acho que é. Ainda não conheço os vizinhos daqui. 
Foram os três bater na casa de seu Inocêncio, Aristeu tomou a frente e perguntou:
- Boa tarde, seu Inocêncio...o senhor por um acaso viu Astolfo, o meu cachorro?
- Vi! – disse ele muito revoltado.
- Ele tomou um banhinho e agora está fazendo um lanchinho para ir embora.
- Como assim, não entendi? – Perguntou Gertrudes.
- Não entendeu, vou explicar... Esse seu cachorro pulou a cerca de novo e está atracado com a Lucrécia lá no quintal. Minha cadela é de raça pura e eu não vou cuidar de um monte de vira-latas. Se nascer filhotes vão todos pra sua casa, dona Gertrudes! Entendeu agora?
- Seu Inocêncio, quem tem suas cabras que as prendam por que meu bode está solto. O senhor está entendendo? – falou Gertrudes dando uma gargalhada.
- Eu vou é matar esse vira-lata, sua maluca!
- Aristeu, você não vai tomar nenhuma atitude?
- Mas, mas, mas...
- Que mas, mas, mas, Aristeu...esse cara me chamou de maluca, e você não faz nada?
- É que...
- Cala a boca Aristeu.  Vou quebrar a cara desse cretino. Aristeu me larga...me larga, Aristeu...
- Mas eu não estou te segurando...
- Então vai lá você e quebra a cara dele.
- Mas, mas, mas...
- Vai quebrar minha cara? Podem vir todos vocês, são três frouxos.- falou o vizinho.
Depois que Inocêncio falou aquilo, Marieta, a empregada, virou bicho, ficou com a macaca, e deu um ataque de piriri.
- Epaaa...olha aqui, agora ofendeu. Frouxo é tua mãe, seu safado, vai levar uma porrada.
E partiu pra cima do homem, dando várias unhadas, e puxando seus cabelos... Aristeu por sua vez foi apartar e logo de cara levou um soco no olho. O vizinho quanto mais tentava se desvencilhar da Marieta, mais batia em Aristeu. Ele apanhou, apanhou e apanhou...mas deu sorte, porque os outros vizinhos o salvaram.
- Mas, mas, mas foi ela quem começou. Eu não, não, não fiz nada, seu Inocêncio. – dizia Aristeu muito nervoso.
- Não sou covarde, não bato em mulheres. - Retrucou Inocêncio. 
- Cadê Gertrudes? Ai, ai, ai...
- Não sei patrão, a última vez que a vi foi quando esse cara também me chamou de frouxa.
Voltaram para casa, Aristeu todo quebrado e Marieta muito da enfezada.
- Meu primeiro dia de trabalho e já me acontece isso. - disse Marieta.
- Gertrudes eu vou morrer. Chame um médico, Gertrudes! – Aristeu.
- Não foi nada, homem, deixe de ser frouxo! – disse Gertrudes.
- Nossa! O Astolfo ficou lá, aquele doido vai matá-lo. – lembrou Marieta.
Então, Gertrudes, usando de todo o seu cinismo, disse: 
- Astolfo já está em casa desde a hora que cheguei. Quando ele viu que o homem estava brabo pulou a cerca de volta. Ele é que nem eu, não gosta de confusão.